Mensagens

A mostrar mensagens de fevereiro, 2015
Imagem
Dás-me aquele abraço?

Acaba sempre por doer

O meu pior defeito é a manipulação dos afetos. Sou ator da minha própria realidade e, sem que o perceba, mascaro todas as situações à minha volta. Por vezes esqueço-me mesmo do que realmente sinto e, por um momento, acredito estar a sentir aquilo que despretensiosamente construo. Não minto. Fi-lo, por vezes, com preocupação pelos outros e pelos seus sentimentos, mas percebi que, de uma forma ou de outra, acaba sempre por doer.  Preferi sempre a solução menos ortodoxa. incorri em erros, uns atrás dos outros, e percebi sempre que poderia ter evitado tudo o que fiz acontecer ao longo da minha vida. Arrependo-me com a certeza absoluta de quem não o voltaria a fazer sabendo a dor que hoje guardo em consequência de todas as vezes em que fui infiel para comigo.   

Eu não posso ser teu amigo

Quis o destino, essa ilusão de fatalidade do real em que nós nos apoiamos para dar justificação àquilo que não entendemos, que um dia nos separássemos bruscamente, obrigados a esquecer a presença do outro. Pior seria uma despedida, um adeus forçado ou então um "seremos sempre bons amigos".  A amizade constrói-se sem pretensões do destino e não dói quando a ausência se faz sentir. Temos saudades dos nossos amigos e daquele abraço que nos conforta, mas não temos uma necessidade da sua presença, do seu odor corporal e, sobretudo, do toque que nos arrepia e queima, aos poucos, a alma. Eu não posso ser teu amigo porque nunca o fui na essência da amizade. Não consigo dar-te a mão e dizer-te para ires em frente, pelo menos não sem mim. 
Imagem
Quando olho para lá é do teu cheiro que me recordo.

A escassez da liberdade

Canso-me de olhar pela janela na tentativa de, lá fora, encontrar uma alternativa para saciar todas as vontades em viver que guardo dentro de mim. Já quis ser médico, professor, veterinário, advogado, jornalista, ator, realizador e até músico, o que é de estranhar para alguém com uma voz tão pouco prodigiosa. O meu problema é que, ao contrário de uma criança que vai mudando de ideias e se apaixona, ao longo do tempo, pela crença que fixa, eu não fixo nenhuma das minhas vontades senão a vontade em querer satisfazê-las. Quando deixo de ver e de ouvir para passar a olhar e a escutar os outros no mundo para lá da minha janela percebo que eu posso mesmo ser a única pessoa certa no meio de tudo isto. Eu limito-me a ter o objetivo de satisfazer a vontade que reside na minha alma, enquanto que lá fora todos os outros se limitam a ignorar o óbvio e correm contra o tempo para o deixar passar e perdê-lo sem nada aprender no seu dia-a-dia. Quem sabe um dia não possa abrir uma barraquinha de l...

A rotina que mata

Transformamos os dias em tempo e perdemos o nosso tempo a preocupar-nos com os dias em que não vivemos. Sou por natureza insaciável e, por vezes, insuportável. Dizem-me os poucos amigos que me acompanham que não nasci para sobreviver mas para enganar a morte, chegando-me sempre perto dela e fugindo-lhe entre os pés. Talvez tenham alguma razão no que dizem, mas não creio tê-la visto alguma vez, salvo quando me entreguei à rotina dos dias que se sobrepõem no calendário, aí, talvez, lhe tenha suplicado alguma misericórdia.  Sobreviver. Quem nasce para sobreviver perde-se na qualidade do viver e esquece-se do que o que realmente importa não são a fama, o poder e o dinheiro, os três pilares que nos conduzem, com maior celeridade, aos caminhos do infortúnio e da desolação. Acredito na alma e nela vivem-se os momentos, os bons e os maus, com os sorrisos e as lágrimas, a alegria e a tristeza. Nela não existem as rotinas.
Imagem
Je ne sais pas.

A estabilidade que incomoda

Quis sempre mais do que aquilo que tive sendo insatisfeito por natureza. Dificilmente, em criança, não fui correspondido nos meus pedidos supérfluos. Hoje sou mais comedido a pedir, mas dificilmente obtenho a resposta que desejo. A verdade é que também não sei, ao certo, aquilo que procuro. Todos os dias mudo a ideia que crio acerca do meu percurso, uns dias sorrio e fico feliz por ter chegado até onde cheguei, nos outros fecho-me e consolo-me com as canções tristes da Simone ao sabor de um copo de vinho e na companhia do cigarro que desaparece em menos de três minutos.  Gostava de ser um daqueles seres satisfeitos e sorridentes. Cada momento um motivo para celebrar, o carpe diem , explicam os sortudos. Mas os momentos não são todos alegres, pelo contrário, há mais motivos de tristezas e de lamento do que de festejo e de celebração na minha vida, mas isso não é sinónimo, em mim, de uma alma perdida e fracassada, apenas insatisfeita, tal como o miúdo de dez anos que já fui....

Fico cego quando te amo

Amar-te é mentir-me a mim próprio sobre aquilo que penso e não o posso permitir porque não sei existir sem o meu pensamento imaculado. Não deixo de ver com clareza cada vez que deixo cair uma lágrima em desespero pela tua ausência, mas esqueço-me de como se olha. Perco a capacidade de tomar atenção às coisas e o tempo passa por mim como se eu não existisse.  Não sei amar porque não sei como viver ao perder a eficiência da visão e por mais romântica que seja a ideia de deslumbrar-me com o mundo ao teu lado, não sei olhá-lo com os teus olhos sobrepostos aos meus. Posso ser egoísta e mal amado, mas não sou cego e gosto de ver as coisas com os meus próprios olhos.